31 May 2016
Nota: Esse exemplo foi retirado de meu antigo blog, e é para o SRD do Fate 3.0 - Espírito do Século lá publicado. Está colocado aqui mais como curiosidade histórica e porque pretendo no futuro transformar ele em um personagem de Fate Básico, seguindo as orientações do livro Strange Tales of the Century da Evil Hat.
OK…
Muitos devem estar com problemas para entender como criar um personagens de Espírito do Século, não? Bem, vamos fazer um exemplo completo. No caso, criaremos um personagem bem típico e estereotipado, que iremos usar em Primordiais: Radaj, o Guerreiro do Futuro.
Obs: O Cenário Gaia 400x foi criado por Márcio Fiorito para a Revista Dragão Brasil 114. Todos os direitos reservados.
Primeira Fase – Infância
Como Radaj veio do futuro, a Primeira Fase é importante para descrever rapidamente a cultura da qual ele veio, além de descrever obviamente a infância do mesmo. Essa descrição na realidade não precisa ser muito ampla em qualquer momento, pois um dos grandes baratos em Espírito do Século é permitir espaço para que o Mestre e outros jogadores “recheiem” os passados uns dos outros e que permitam ao jogador criar histórias interessantes no futuro.
Radaj nasceu em Gaia 400x, uma versão pós-apocalíptica da nossa Terra, onde tecnologia, magia e criaturas estranhas vivem. Nascido em uma pequena vila próxima a um dos principais metrocentros, e filho de um dos guerreiros que protegiam sua vila, teve uma infância dura, apesar de não ter sido espancado ou qualquer coisa do gênero. Radaj demonstrava-se muito forte e rápido para a sua idade, e quando as brincadeiras infantis eram de batalhas simuladas com gravetos, era muito fácil para ele desarmar os demais. Aos 15 anos, recebeu no leito de morte de seu pai a Espada de Gel Cinético (Gel-C), o item pelo qual mais presa em toda a sua vida, e foi ao metrocentro servir como soldado, onde treinou até dominar a arte de usar tal lâmina.
Terminamos aqui a descrição do mesmo. É interessante perceber como a descrição dá o suficiente para estabelecer algumas coisas. Agora escolheremos os Aspectos para Radaj.
Analisando bem, podemos perceber alguns Aspectos interessantes: primeiro, Gaia 400x, o “mundo” de onde ele veio, é a nossa Terra em um futuro pós-apocalíptico (potencialmente uma dimensão paralela), portanto podemos optar por Homem do Futuro. Esse Aspecto Homem do Futuro parece poderoso demais, pois ele em potencial permita que o personagem invoque-o para fazer coisas muito poderosas, mas o Mestre tem o potencial de Disparar esse Aspecto para causar estranheza em Radaj com o nosso mundo. Então as coisas se equilibram.
Como segundo Aspecto, podemos pensar em Forte, mas a Espada de Gel Cinético parece algo muito mais divertido, pois sempre terá um vilão interessado em obter essa Espada para estudá-la. Então ficaremos com a Espada de Gel Cinético, uma vez que, se é para ter a Espada ocasionalmente roubada, é legal levar algum por isso na forma de Pontos de Destino.
Bem, temos uma das cinco fases cumpridas. Sigamos em frente para a Segunda Fase.
Segunda Fase – Guerra!
Normalmente, a segunda fase indica como os personagens se envolveram na Grande Guerra (caso tenham o feito) e como. No caso de Radaj, será necessário “aprofundar um pouco as coisas” para explicar como ele veio parar em nosso tempo. Desculpas esfarrapadas existem aos montes (isso é pulp, por Deus!) mas fazer uma boa história para que a coisa seja coesa e não uma grande “colcha de retalhos” é muito importante, embora seja problemático.
Radaj estava enfrentando alguns Xenomorfos, monstros mutantes que atacam os metrocentros, em uma montanha a alguns quilômetros do metrocentro. Nesse momento, um estranho portal se abre e suga Radaj do nada.
Quando ele acorda, Radaj está em um local extremamente estranho, onde um homem com uma capa escura se identifica com Rudolph Scheitzel, Grão-Mestre da Ordem Ariana Estoica, que o chamou para lutar do lado deles para a purificação do mundo daqueles que eles consideram indignos. Revoltado, Radaj rompe o círculo místico e enfrenta o Grão-Mestre e consegue, a muito custo, fugir da Ordem Ariana Estoica.
Sem saber como voltar, tudo o que ele sabe é que a Ordem Ariana é maligna, e ele torna objetivo de vida proteger esse mundo estranho da ameaça deles. E percebe que sua tecnologia é suficiente para enfrentá-los, embora vencê-los vá envolver mais que isso. Nesse momento, é contactado por Angelus, que explica-lhe sobre o que lhe aconteceu e diz, com pesar, que é incapaz de levá-lo de volta à sua realidade. Desse modo, cabe a Radaj tornar esse novo mundo em seu lar.
Dito isso, temos uma ideia de que Radaj foi invocado à força para lutar em uma causa que vai totalmente contra seus princípios, conseguiu fugir mas torna-se incapaz de voltar para seu mundo. Então jura que irá proteger o mundo contra o mal que o invocou.
Agora, voltando-se aos Aspectos: considerando o que ele fez contra a Ordem Ariana Estoica, e o desejo dos mesmos por sua tecnologia, é de se supor que Radaj tenha se tornado um Inimigo da Ordem Ariana Estoica. Desse modo, Radaj estará encrencado onde quer que passe, mas saberá se a Ordem Ariana passou por perto.
Como segundo Aspecto, fica difícil dar um Aliado para Radaj, mesmo considerando Angelus. Então, pode ser interessante colocar um juramento dele ao decidir proteger esse mundo: “Pelos Cristais de Energia, eu protegerei esse Mundo Anterior”. É importante aqui não exatamente a frase, mas seu sentido: Radaj decide por si próprio proteger um mundo que não compreende e que não o compreende.
Terceira Fase – A Aventura!
Digamos que esse é o “último estágio” de criação individualizada do personagem. Depois dessa Fase, tudo dependerá da aprovação do Mestre e dos demais jogadores. Mas existe uma boa coisa: essa Fase é O MOMENTO do personagem, a Grande Aventura dele. Nesse momento você cria a sua Grande Aventura, onde a Estrela é o seu personagem.
Primeiro, escolhemos um nome para a Aventura. No caso, a escolha óbvia seria Radaj, o Guerreiro do Futuro. Mas isso não é cool… Precisamos de Drama, de Ação, de Mistério, de Perigo e de todas aquelas coisas que tornam o pulp algo extremamente divertido. Então vamos salpicar um pouco mais de mistério. Na Segunda Fase temos uma boa ideia do tipo de coisa a usar: o nome da nossa aventura será Radaj o Guerreiro do Futuro em… O Mestre dos Xenomorfos.
Temos nossa aventura, então vamos criar a história per se. A melhor forma nesse caso é criar o “texto de lombada” do mesmo:
Vindo de um futuro estranho e sem compreender nosso mundo, Radaj é um soldado e guerreiro que defende a justiça armado de suas armas estranhas, em especial da poderosa Espada de Gel Cinético. Mas o perigo ronda o mundo quando os malévolos Mestres Obscuros do Lótus Negro trazem do mesmo futuro de Radaj as perigosas e bizarras criaturas conhecidas como Xenomorfos. Como Radaj irá enfrentar essas criaturas? Será que a tecnologia de nosso tempo será o bastante? Ou será que apenas a Espada de Gel Cinético será capaz de deter o perigoso Tong Han, Senhor da Escuridão, Mestre dos Xenomorfos e Lorde do Lótus Negro?
Aqui temos uma ideia do que aconteceu: Radaj descobre que uma ordem maligna consegue invocar os Xenomorfos, os monstros que atacam e destroem os metrocentros de Gaia 400x. Sabendo do que eles são capazes e prevendo que nosso mundo será incapaz de resistir ao ataque dos mesmos, ele parte com alguns companheiros (nas outras fases descobriremos quais) e consegue (obviamente) dizimar a maior parte dos Xenomorfos. Mas Tong Han escapa, e com ele também as formas de invocar-se os Xenomorfos.
Agora, os Aspectos: podemos escolher logo de cara uma segunda inimizade, que seria ser Inimigo de Tong Han, Lorde do Lótus Negro. Mas lembremo-nos que ele já é inimigo da Ordem Ariana Estoica, o que foi apresentado na Segunda Fase como Aspecto. Mais uma inimizade geraria dor de cabeça demais para Radaj (além de sobrevalorizar o personagem na campanha) então vamos trabalhar o conceito de forma diferente.
Um primeiro Aspecto pode vir do fato de que os Xenomorfos devem ter sido vencidos principalmente por ele (claro que com ajuda). Poderíamos colocar algo como Apto para lidar com Xenomorfos como Aspecto, mas fica mais legal se colocarmos como uma frase, que nem fizemos na Segunda Fase com o Aspecto “Pelos Cristais de Energia, eu protegerei esse Mundo Anterior”. No caso, um pouco de bravata também é totalmente pulp, então a típica “Deixem que eu cuido desses malditos Xenomorfos!” é extremamente bem-vinda.
O Segundo Aspecto ainda fica meio nebuloso… Como enfatizamos o fato de que Radaj não sabe nada muita coisa desse mundo, a opção Forasteiro poderia aparentar interessante. Porém, isso poderia ser o mesmo que “dar corda para o personagem se enforcar”: o Aspecto Homem do Futuro já prevê o fato que Radaj não se sente a vontade no nosso mundo. Essa resolução é complexa, mas podemos partir para algum Aspecto que o Mestre espere em campanha. Como Radaj está sendo criado para o Cenário Primordiais que estamos falando aqui, essa é uma escolha óbvia, portanto ficamos com ela.
Maravilha! Temos um personagem pulp com sua história e agora vamos tecer as participações especiais!
Quarta Fase – 1ª Participação Especial
A Quarta e Quinta Fases são parecidas, pois nelas são decididas as participações especiais dos personagens da campanha. No caso, é decidido tanto quem faz participação especial na aventura de Radaj quanto em qual aventura Radaj fará participação especial.
Na Primeira Participação Especial, o “Herói Convidado” para ajudar Radaj será Katsuya Kanzaki, que entrará como um combatente que, com o seu Kyuuryuujinkai Karate irá ajudar a Radaj enfrentar os Xenomorfos. Por incrível que pareça, tudo que será adicionado será algo como: “… com a ajuda dos poderosos punhos de Katsuya Kanzaki e seu Kyuuryuujinkai Karate …”. Desta feita, a ponta de Radaj está OK. Claro que podemos dar uma melhorada nessa descrição, mas por agora está de bom tamanho.
Já no caso da participação especial a ser feita por Radaj, a aventura será a aventura de Ingrid Ni Braoahbahain, A Sacerdotisa de Avalon e os Lobos de Loki. Basicamente tanto Ingrid quanto Radaj são muito deslocados do resto do mundo, ela por vir de um dos “Reinos Exteriores”, ele por ter vindo do futuro. Ele tem sua Espada de Gel Cinético roubada por um grupo autointitulado Os Lobos de Loki, junto com outros itens “mágicos” ou no mínimo incomuns, incluindo a Harpa de Ingrid, para causar o Ragnarök, a destruição do mundo. Ajuntando-se com Ingrid, ele auxiliou-a na invasão à base dos Lobos e recuperando sua Espada de Gel Cinético, atrasando os gobelin enviados pelos Lobos para impedir Ingrid, enquanto essa avançava para derrotar os malditos seguidores de Loki. Essa batalha ele lutou com armas na maior parte do tempo, mas quando o inimigo encontrava-se desarmado, ele usava os punhos (na realidade, isso foi uma forma pensada pelo jogador para “fugir do foco” – uma batalha desarmada é mais prolongada que uma armada). Com isso arrumou uma aliada poderosa e mais preparada que ele para lidar com o “mundo moderno”. O jogador de Radaj e de Ingrid chegam a um acordo de como colocar isso na “Aventura” dela.
Pelos acontecimentos, em teoria um dos Aspectos seria decidido pela sua participação em A Sacerdotisa de Avalon e os Lobos de Loki e o outro pela participação de Katsuya em sua aventura. Mas nesse caso vamos optar por definir os dois baseados na participação na Aventura de Ingrid.
O primeiro Aspecto é o próprio fato de ter conseguido uma Aliada: Ingrid Ni Braoahbahain. Esse Aspecto poderá lhe ajudar muito, mas ao mesmo tempo será ela quem precisará de ajuda.
O segundo Aspecto não possui nada definido. Se não tivéssemos optado por escolher a Espada de Gel Cinético anteriormente como Aspecto, aqui seria um ótimo ponto, mas esse não é o caso. Outra citação poderia ficar repetitivo, e não temos ideias do tipo de fobias que Radaj poderia ter ao enfrentar seus inimigos. Mas podemos pensar que ele não utilizaria sua Espada de Gel Cinético contra pessoas que estejam desarmadas, como ele fez. Então podemos optar por um Cavalheirismo em combate. Isso irá complicar a vida dele quando ele enfrentar seus inimigos, pois nem sempre ele recorrerá à Espada de Gel Cinético, mas inimigos mais “honrados” o respeitarão por sua coragem.
Falta pouco para terminarmos os Aspectos. Apenas mais uma fase.
Quinta Fase – 2ª Participação Especial
OK… Essa é a 2ª e última participação especial de Radaj, o Guerreiro do Futuro. No caso dele, a segunda participação especial será de Yelena Kievskaya. O jogador gostou da ideia pois essa “participação” pode ter ocorrido antes de sua aventura, uma vez que com a ajuda de Yelena e do Espírito de Luz Antonov ele chegou até Tong Han.
Quanto à Participação Especial, Radaj foi um dos vários Primordiais a participar da Aventura de Yelena Kievskaya: Yelena Kievskaya e o Mal de Aztlán. Como um combatente proficiente, sua Espada de Gel Cinético é requisitada em muitos lugares. Além disso, aparentemente Tupac Zapator invocou poderosos Xenomorfos, o que deu a ele um motivo ainda maior para lutar.
Quanto aos Aspectos, um deles pode ser Guerreiro Proficiente. Aparentemente alguém pode se perguntar se isso é necessário para ele tendo Homem do Futuro, mas na real ele não tem uma forma de, com o uso de invocações de Aspecto, “turbinar” suas manobras de Ataque.
O segundo pode ser baseado indiretamente na aventura em questão. Nessa aventura, uma outra personagem, Hannah Striker, conseguiu “roubar” um Hidroavião (que acabou tornando-se um Aspecto). No voo nessa máquina, o Aspecto Homem do Futuro foi potencializado pela sua curiosidade em saber como um Hidroavião funciona sem Cristais de Energia, Gel Cinético ou campos gravíticos ou qualquer outra forma de propulsão convencional (na visão dele de Homem do Futuro). Para enfatizar isso, podemos escolher um Aspecto, e no caso é Curioso quanto a Máquinas do presente: ele ajudou Hannah nas Adaptações de Lollipop, enquanto aprende sobre a estranha tecnologia atual. Mas claro que esse Aspecto tem seu lado negativo: ele pode acabar fuçando em todo o tipo de tecnologia moderna, inclusive (e principalmente) onde não deveria.
Terminamos com os Aspectos… Mas ainda não acabamos! Falta agora selecionar suas perícias e Façanhas.
Perícias
Vamos para a seleção de Perícias. De cara, como a proposta é que Radaj seja um combatente, podemos imaginar que suas perícias Briga, Armas Brancas, Armas de Fogo e Resistência sejam elevadas. Então o jogador opta por Armas Brancas como Excepcional, devido à Espada de Gel Cinético, colocando Resistência e Briga como Espetaculares e o primeiro Ótimo em Armas de Fogo (o Mestre pode vir a autorizar que Radaj tenha algumas armas de fogo, mas devido a seu Cavalheirismo em Combate ele dificilmente a utilizará). Os dois slots que restam de Bom ele irá colocar para Determinação (colocando aqui sua força de vontade) e Esportes (para esquiva, corridas e perseguições). Quatro slots estão disponíveis no nível Bom, para os quais optamos em Prontidão, Furtividade, Empatia e Investigação (como complemento para a suas perícias de guerreiro e soldado)
Temos cinco slots Razoáveis, mas todas as perícias que precisávamos já foram mais ou menos cobertas. Podemos optar aqui por Sobrevivência (Radaj sabia como se cuidar fora dos metrocentros, e muito desse conhecimento ainda é útil), Ciência (tanto para a Super-Ciência de Gaia 400x quanto para a ciência “moderna”), Estudos (valendo o mesmo de Ciência), Engenharia (o mesmo de Ciência e Estudos) e Mistérios (alguma coisa do seu conhecimento de Xenomorfos e da super-ciência de Gaia 400x pode acabar caindo aqui, como os Cristais de Poder e sua sintonização).
Na maioria das fichas “faltariam” algumas coisas, mas Radaj não sente falta, por exemplo, de Ladinagem e Liderança (ele era um soldado “comum” de Gaia 400x) e não teria como conseguir Recursos ou Fascinar. Então, vamos às Façanhas.
Façanhas
No caso das Façanhas, é razoavelmente fácil pensar: de cara, temos a Façanha Arma do Destino. Ela exige um Aspecto com o nome da Arma, o que já temos para a Espada de Gel Cinético (outras armas não são relevantes). Essa benção já impede que Radaj fique sem a mesma por muito tempo. E como se isso não fosse pouco, a Espada de Gel Cinético recebe a melhora Habilidade (+1 em todos os usos dela). Adicionamos a ela Inacreditável, uma vez que o Gel Cinético é um material que só poderia ser sintetizado com o uso de Ciência Louca. Como a Arma Destinada é tratada como um Artefato, não é necessário “pagar” um extra por usar Ciência Ensandecida. Como forma de “turbinar” esse efeito, compramos também Aparato Pessoal: nesse caso, recebemos mais 3 melhorias para adicionar à Espada de Gel Cinético. Essas melhorias são aplicadas em Melhoria: Efeito Cinético de Ataque que aumenta o potencial de ataque da arma devido às características do Gel Cinético (+2 em todos os testes de ataque), Melhoria: Efeito Cinético de Defesa para o mesmo na defesa (+2 em todos os testes de Aparar) e Melhoria: Trespassar, que permite usar a Espada de Gel Cinético para derrubar paredes (substitui Engenharia por Armas Brancas em testes de Demolição para escapar de recintos ou arrombar paredes ou portas). Por fim, para torná-lo um Espadachim extremamente mortal, compramos Aparar Perfeito, Contra-Ataque e Reviravolta. Essa combinação mostra a capacidade mortífera de Radaj, ainda mais somando-se os poderosos benefícios da Espada de Gel Cinético.
Equipamento e Detalhes afins
Para encerrar, definimos alguns detalhes e equipamento. Ele tem por volta de 23 anos, é do sexo Masculino, tem cabelos e olhos verdes (algo razoavelmente normal em Gaia 400x) e seus equipamentos se resumem a uma mochila com algumas roupas e equipamentos de Gaia 400x (incluindo lascas de Cristais de Poder encontrados por ele) e sua Espada de Gel Cinético… Não existe nada mais que ele possua de relevante.
Atualmente mora com Ingrid em uma casa em algum lugar da Irlanda. Fala inglês (parece que o idioma de Gaia 400x é similar ao inglês), mas possui problemas com algumas palavras e construções, e fala ocasionalmente gírias de Gaia 400x.
Ele deseja voltar para Gaia 400x se for possível, mas ele imagina que não haverá como, portanto ele irá defender a terra onde ele vive agora, mesmo que eles não o compreendam.
Além disso, a Trilha de Dano de Radaj recebe duas caixas em Saúde (devido à Resistência alta) e uma em Compostura (devido à Determinação alta).
Com isso, temos sua ficha completa, como apresentado abaixo
Radaj, o Guerreiro do Futuro
Homem de Outra Era e Primordial
Características
- Idade: 23
- Sexo: Masculino
- Nacionalidade: Gaia 400x
- Cabelos: Verdes
- Olhos: Verde
- Características Marcantes: roupas futuristas, acessórios “bizarros”
- Aventura: Radaj o Guerreiro do Futuro em… O Mestre dos Xenomorfos
Aspectos:
- Homem do Futuro
- Espada de Gel Cinético
- Inimigo da Ordem Ariana Estoica
- “Pelos Cristais de Energia, eu protegerei esse Mundo Anterior”
- “Deixem que eu cuido desses malditos Xenomorfos!”
- Primordial
- Aliada: Ingrid Ni Braoahbahain
- Cavalheirismo em combate
- Guerreiro Proficiente
- Curioso quanto a Máquinas do presente
Perícias:
Nível |
Perícia |
Perícia |
Perícia |
Perícia |
Perícia |
|
Excepcional (+5): |
Armas Brancas |
|
|
|
|
|
Espetacular (+4): |
Resistência |
Briga |
|
|
|
|
Ótimo (+3): |
Armas de Fogo |
Determinação |
Esportes |
|
|
|
Bom (+2): |
Prontidão |
Furtividade |
Empatia |
Investigação |
|
|
Razoável (+1): |
Ciência |
Sobrevivência |
Estudos |
Engenharia |
Mistérios |
|
Façanhas
- Arma do Destino
- Engenhoca Pessoal: Espada de Gel Cinético
- Aparar Preciso
- Contra-Ataque
- Reviravolta
Engenhoca Pessoal: Espada de Gel Cinético
- Habilidade: +1 em Armas Brancas ao usá-la (por Arma do Destino);
- Inacreditável (por Arma do Destino);
- Melhoria: Efeito Cinético de Ataque (+2 em todos os testes de ataque)
- Melhoria: Efeito Cinético de Defesa (+2 em todos os testes de Aparar)
- Melhoria: Trespassar (substitui Engenharia por Armas Brancas em testes de Demolição para escapar de recintos ou arrombar paredes ou portas)
Linha de Tensão:
- Vitalidade:
7
- Auto-Controle:
6
31 May 2016
Por Fábio Emilio Costa
Olá!
A idéia de Aventuras Primordiais! é escrever uma pequena série de contos interligados entre si passando-se no ambiente pulp que desenvolvi parcialmente, Primordiais. A idéia é mostrar uma ventura pulp e cliffhanger que dê uma noção do que se esperar em Espírito do Século. De qualquer modo, farei o melhor para que saia o melhor possível.
Bem depois dessa introdução besta, vamos ao que interessa:
Acima de Espoo, Finlândia, 12:00 hora local
- Está realmente frio! – disse Ingrid, se embrulhando a sua manta verde.
- Deseja meu casaco, Ingrid-kynjah ? – disse Radaj, começando a despir-se de seu casaco futurista que trouxe de Gaia 400X, sua “terra natal”, parte de um futuro distante.
- Não, obrigada… – disse Ingrid, em meio ao barulho dos motores de hélice do Lollipop, o hidro-avão de Hannah, que cruzava os céus sobre o Mar Ártico.
- Vocês dois, por favor se sentem! – disse Hannah, olhando os aparelhos. – A meteorologia está indicando rajadas de vento forte e turbulências. É melhor não ficarem em pé ou podem acabar se machucando.
Hannah estava vestida em um belo vestidinho rosa e casaco bem quente de cor verde, mas seu comportamento não era o de uma menininha doce, e sim de um piloto de aviões de verdade. Ingrid respeitava isso em Hannah: sabia que ela tinha perdido o pai muito cedo, durante a Guerra, sendo que ela viu seu pai sendo derrubado por ninguém menos que o lendário Barão Vermelho. Como Primordial, ela não tinha como chorar. Mas Ingrid ouvia às vezes ela chorando em seus pesadelos de uma criança que perdeu os pais, na casa que compartilhavam em Sligo…
Os dois adultos se sentaram em duas cadeiras, uma para co-piloto e outra para telegrafista. Hannah não precisava de ninguém ocupando ambas as posições, embora a ajuda fosse bem vinda.
Foi quando…
O avião começou a sacudir sem parar:
- O que está acontecendo, Hannah-kynrian ? – Radaj perguntou, temerosos – São…
- Sim, Radaj, estamos em uma área de turbulência! – disse Hannah – Se segurem. Vou baixar nossa altitude e tentar sair dela. Está muito forte, não tenho condição de passar por ela sozinha.
Hannah foi abaixando o avião normalmente, até que…
Um grande estrondo foi ouvido:
- O que está acontecendo? – disse Ingrid, olhando para Hannah. Ela percebeu o olhar de medo na pequena criança.
- Um dos motores explodiu e uma das asas foi com ele! Deve ter sido um raio ou alguma coisa! – disse ela – Vamos ter que pousar… Vai ser duro!
Hannah puxou o manche para trás com toda a (pouca) força que tinha. Ela estava com muito medo: uma queda poderia ser fatal. O avião foi se alinhando aos poucos, mas ainda assim a batida foi forte. O avião se espatifou contra o chão, e o mundo rodou e rodou. O outro motor voou longe com a outra asa no impacto, o corpo do avião despedaçando-se como a casca de um ovo e os três chacoalhando e chacoalhando dentro dos restos da cabine.
Quando tudo parou, Hannah olhou para os lados: Ingrid e Radaj estavam desacordados, aparentemente muito feridos. Uma linha vermelha na testa de Ingrid não era feita pelos seus cabelos naturalmente vermelhos. A própria Hannah se sentia machucada. Pegou a bússola portátil e um rádio comunicador:
- Mayday! Mayday! Aeronave Lolipop caída na região da Lapônia! Mayday! Mayday! Aeronave Lolipop caída na região da Lapônia! – Ela foi dizendo, enquanto saía da cabine e via a nevasca intensa.
Sem pensar, ela seguiu andando. Ela teve então a noção dos seus ferimentos: estava andando com dores e o corpo todo parecia que tinha levado uma imensa sova. Ela própria estava muito ferida, mas não podia desistir. Continuou andando a diante e a diante, falando e falando, a bússola enlouquecida conforme chegava perto do Polo Norte magnético. Até que seu corpo não agüentou mais e desabou.
- Mayday! Mayday! Aeronave Lolipop caída na região da Lapônia! Mayday! Mayday! Aeronave Lolipop caída … Aeronave Lolipop caída… Aeronave Lolipop … Aeronave Lolipop … Lolipop … Lolipop …
Ela foi perdendo as forças, um sono mortal se abatendo sobre ela, suas roupas de frio mal e mal a protegendo da nevasca inclemente. Ela tombou, seus olhos verdes olhando apenas pouco acima da neve.
E ela viu…
Uma pessoa com roupas colantes verdes, e botas de mesma cor. A visão embotada não deixava ela entender o que estava vendo. Ela sussurrou:
- Sal… ve…-os…
E fez-se escuridão.
Cidade do Natal, Polo Norte, Dia Seguinte, 20:00 hora local
“… ela está bem? Por Ceridwen, diga que ela está bem…”
“… ela vai ficar bem… Deixe ela descansar…”
“… pelos Cristais, se ela morrer, nunca me perdoarei!”
Hannah começou a voltar a si:
- Não se preocupem, ela só está inconsciente. Mas se Benhardt não tivesse a resgatado a tempo… É muita sorte terem caído perto da zona de vigilância. Melchior não ficou muito contente com isso, mas de outra forma, vocês estariam mortos. E o Pai Natal não gostaria nada disso.
Aos poucos, Hannah foi abrindo os olhos:
- O… que… houve…
- HANNAH!!!!
Hannah sentiu algo a abraçando: tinha um cheiro gostoso, de eucalipto e menta, jasmim silvestre e rosas, e outras flores. E uma sensação macia na bochecha, mas algo úmido e salgado descia. Ela então terminou de abrir os olhos.
Ingrid Ni Braoahbahain estava chorando, agarrada a ela.
- Hannah, que bom! Você foi muito corajosa! – Hannah viu que a testa de Ingrid estava com bandanas de linho branco, assim como partes do braço. No fundo do quarto, Radaj também estava com curativos: seu braço direito estava em uma tipóia e no rosto uma gaze era segura por uma fita adesiva.
- O que houve?… Onde estamos?… - disse Hannah, ainda sentindo a moleza de quem passou muito tempo inconsciente.
- Você está bem, Hannah Striker? – disse uma voz.
Ela olhou para o lado e viu uma bela menina, mas…
- Você é uma….
As orelhas levemente pontudas e a roupa entregavam o ser. O vestido era em tons vivos de verde escuro e vermelho carmesim. Era possível, abaixo do vestido, ver-se os meiões branco-e-vermelhos e os sapatos de veludo verde. Um chapéu pontudo vermelho ficava acima dos cabelos fartos e marrom-avermelhados, amarrados às costas em uma trança.
O rosto redondo daquele ser estranho era bonito: grandes e gordas e rosadas bochechas e lábios que pareciam nunca deixar de sorrir, um narizinho redondo e arrebitado e olhos de um verde muito, muito profundo, ao mesmo tempo novo de esperança e velho de sabedoria. As orelhinhas que lhe saiam aos lados eram levemente mais pontudas e maiores que as de uma pessoa normal.
- Sim. Meu nome é Liana. Você é Hannah Striker, não? Era você que pilotava aquele avião?
Hannah não sabia o que pensar: ainda estava confusa com tudo o que estava acontecendo. Apenas meneou a cabeça em resposta à pergunta que lhe foi feita.
- Vejo que está bem, mas deve ficar deitada. Por muito pouco não morreu congelada. Vou trazer algo para você comer. Acho que uma boa sopa quente deve servir… – disse a duende Liana ao sair do quarto
Depois dessa visão confusa, Hannah reparou aonde estava:
O quarto com porta redonda não era muito alto: Radaj quase batia com a cabeça no teto baixo, com pouco mais de 2 metros de altura. As proporções de todos os objetos e as cores vibrantes lembravam as casas de boneca que tinha quando seu pai ainda vivia. Ingrid e Radaj estavam vestidos em roupas também em cores vibrantes como o quarto: Radaj com calças em azul-marinho e colete amarelo encimando uma camisa verde, Ingrid com um vestido vermelho carmesim com filigranas e cinzidos dourados, uma faixa verde-musgo na altura da cintura.
- Onde estamos? Lembro só da bússola enlouquecida…
- Nem eu sei direito. – disse Radaj – Mas é um local realmente estranho. Vimos vários desses faeryn andando para cima e para baixo. Eles não parecem com nada de minha terra.
- Na verdade, eu sei onde estamos. – disse Ingrid – Estamos em um Reino Exterior.
- Mas como? – questionou Hannah – Pensei que os Reinos Exteriores fossem isolados de tudo na Terra.
- Você viu o portal para Aztlan e viu Atlântida quando salvamos L’Khurn e selamos um acordo de paz com os atlantes. Nenhum desses locais estão fora da Terra, por assim dizer, mas não são fáceis de chegar. É só lembrar que você mesmo disse que sua bússola estava enlouquecida.
- Mas onde estamos? Que reino é esse?
- Só existe um lugar como onde estamos. Vi ele apenas uma vez, durante meu tempo como noviça da Torre Silenciosa, próxima ao Tor de Avalon, de onde víamos Morgana fazer os sagrados rituais com a Taça e com o Prato, com a Espada e com a Lança, diante do Lago Sagrado de águas límpidas.
- E que local é esse onde estamos? – questionou Radaj
- Dinas Nadolig, a Cidade do Natal.
- A Cidade… do Papai Noel? – disse Hannah, com o rosto ao mesmo tempo esperançoso e cético.
- Sim… As cores do natal e do Yule estão em toda parte, mesmo nas roupas que nos ofereceram. O vermelho carmesim, do sangue da vida. O verde musgo, da natureza que ressurge. O amarelo dourado, do Sol que volta a distribuir seu calor. O azul marinho, da água que volta a correr. Os símbolos estão em todos os locais: o visgo, o carvalho, o freixo, as torcas. Os símbolos universais do Natal e do ressurgimento da vida.
- Ingrid-kynjah, o que é esse Papai Noel? – disse Radaj – Já viu alguns desse tempo falar sobre esse ser. Quem é ele?
- Papai Noel, O Bom Velhinho, Pai Natal… Todos são expressões da crença das pessoas no ressurgimento da vida. É o momento em que ressurge o Grande Deus, dado à luz pela Grande Deusa. Os cristãos também simbolizam o nascimento de Jesus, em quem colocam suas crenças. Todas elas tem o mesmo funamento, o ressurgimento da vida.
- Mas esse Papai Noel existe?
- Sim… – disse Ingrid
- Meu pai se vestia de Papai Noel todos os anos! – disse Hannah
- Seu pai fazia isso para manter você acreditando em uma verdade que a Ciência e a Mente não explicam. Talvez da maneira errada, mas seu pai procurava lhe fazer entender que nem tudo é o que é. Você deve saber mais do que nunca agora isso.
Hannah acenou com a cabeça.
- Eu encontrei apenas uma vez o Pai Natal. Era época de Yule, e ele tinha que fazer sua tradicional entrega de presentes.Ele resguardava os mais pobres e os mais infelizes. Lembro de um garoto que andava com ele. Era humano mesmo, e não era muito alto. De certa forma, lembrava você, Hannah. Fico imaginando se ele está bem.
- Estou bem sim, Ingrid ni Braoahbahain – disse uma voz gostosa e profunda. – É bom saber que lembra de mim…
- PAPAI NOEL! – gritou Hannah, feliz.
- Sven… Carlsberg? – disse Ingrid, agora incrédula.
Cidade do Natal, Polo Norte, 6 dias depois
Hannah estava no seu novo quarto. Na verdade um quarto maior, mas ainda assim com as mesmas cores vibrantes e proporções de uma casa de bonecas. Uma grande lareira crepitava chamas fortes ao redor das três camas e do pequeno sofá. Uma mesinha de centro tinha uma bandeja com chá e scones e biscoitos de gengibre e outras coisas boas de se comer.
Em um canto, sentada em uma cadeira de espaldar alto, Ingrid lia um antigo livro que carregava consigo. Hannah sabia tratar-se do seu “Diário das Sombras”, um diário secreto que apenas Ingrid deveria ler, com várias coisas que ela precisava saber sobre o seu treinamento como Sacerdotisa do Reino de Avalon. Estava escrito na língua de Avalon, o Avalönenn. E, embora soubesse algumas palavras nesse idioma, Hannah não sabia ler ele.
- O que você está lendo, Ingrid-kynjah? – disse Radaj, depois de ter feito seu treinamento diário com a Espada de Gel Cinético.
- Estou tentando lembrar uma coisa… Não acredito que o Pai Natal soubesse meu nome inteiro. Apenas Sven sabia…
- Mas ele não pode ser Sven?
Bateram na porta.
- Quem é? – disse Hannah
- Sou eu, Liana! – disse a pequena duende que era agora uma espécie de camareira para eles.
Liana entrou: hoje vestia vestido amarelo sobre camisa branca de mangas bufantes e chapéu branco, com meiões amarelo-e-vermelho e sapatos verdes.
- Pois não?
- O Pai Natal pediu para vocês irem até o Salão dele. Disse que vocês devem se aprumar e que podem usar qualquer coisa que esteja nos armários. Ele apenas pediu ao homem de nome estranho – ela disse, fazendo uma reverência a Radaj – que deixe sua arma aqui. Nada será tomado.
- Entendo… Muito bem, diga a ele que iremos.
Os três entraram no Salão de trabalho do Papai Noel: Hannah decidiu que era momento de se vestir como menina, e não como ocasionalmente se vestia, usando roupas de menino. Vestiu um vestido verde-musgo com cenzidos em dourado e amarrou os cabelos em duas maria-chiquinhas com fitas vermelhas e verdes. Pegou um par de sapatilhas verdes e meias vermelhas por cima de meiões verdes. Ingrid estava vestindo um vestido de veludo vermelho com um capuz também vermelho, usando sapatos verde e meias vermelhas. Radaj usava colete amarelo e camisas brancas com calças de cor branca também.
- Desculpem-me incomodá-los. Sei que ainda estão se curando dos ferimentos daquele acidente terrível. Mas quero aproveitar e saber o que vocês estão sabendo do mundo lá fora. Ainda estamos em outubro, então está muito longe a data de eu correr o mundo na minha viagem de todos os anos… Mas vejo que têm questões a me fazer.
- Sim – disse Ingrid – Você é mesmo Sven Carlsberg? Aquele garoto era mais novo que eu quando visitei Dinas Nadolig anteriormente… Como poderia ter ficado tão velho quanto o próprio Pai Natal?
- Sou eu mesmo, Ingrid. – disse o Pai Natal – Eu concluí a Sucessão, Assinando a Santa Cláusula. Acho que você sabe do que se trata.
- Então era verdade. – disse Ingrid, impressionada – Nunca existiu UM Pai Natal, e sim vários.
- Exato. – disse Sven, dando uma risada gostosa que contagiou o rosto de Hannah – Então ela é Hannah Striker?
- Sim, Papai Noel.
- Seu pai era um bom homem. É triste que bons homens morram em coisas como guerras, mas um homem que foi honrado até mesmo por seus inimigos era um homem digno. Sim, – disse ele, ao ver a cara de espanto de Hannah – sei sobre o Barão Vermelho e sobre como, após ele derrubar o avião de seu pai, ele se levantou do assento do avião dele e o saldou como um valoroso homem. Espero que Primordiais como você um dia acabem com a guerra, mas esse é um sonho que eu não posso realizar.
- Mas o que desejo saber é para onde vocês iam? – perguntou Sven. Ingrid reparou no olhar de Sven, ou melhor, do Pai Natal. Seu olhar era penetrante e profundo, e mesmo com o rosto ainda levemente sorridente, havia uma seriedade de quem se preocupa com os acontecimentos de fora.
- Procuravamos ver Angelus, o Arcanjo. – disse Ingrid
- O que uma Sacerdotisa de Avalon iria desejar com um Arcanjo? Pensei que Avalon não gostasse muito de cristãos… – disse Sven, sorrindo levemente.
- Você sabe tão bem quanto eu que Avalon se afastou do Mundo Interior apenas porque estávamos sendo perseguidos pela Igreja. Mesmo hoje a travessia pelas Brumas é dificultada pelos monges da Ordem de São Silvestre. Mas não acredito, nem minhas superioras também, que essa seja a vontade de Deus, mas sim de homens que confundiram seus deveres com o direito de dizer aos outros o que é certo ou errado.
- Compreendo… Mas por que procuravam Angelus?
- Por isso. – disse Ingrid, mostrando o Filigrana parcialmente destruído a Sven.
Pela primeira vez Ingrid viu o rosto do Papai Noel, ou melhor, de Sven Carlsberg sério. Havia um ar real de preocupação em seu rosto:
- Liana, quero que traga algo para comermos aqui. E também procure Melchior e Gaspar. Precisarei dos dois. Benhardt se não estiver ocupado deve vir também. Diga-lhes que é urgente. – disse ele em voz baixa a Liana, que fez uma reverência e saiu em silêncio.
- Ingrid, você sabe o que é isso, não? Um Filigrana escrito no idioma maldito do Reino das Profundezas…
- Atlantis? – disse Hannah – Mas a gente não tinha…
- Não, pequenina, L’Khurn não traiu o acordo que foi feito. Isso não é Atlante, mas sim vindo do idioma maldito de R’Lyeh!
O som daquele local fez Hannah soltar um gritinho de criança realmente assustada e se encolher atrás de Ingrid.
- Prometo não mais falar esse nome ignóbil aqui! – disse Sven, sério – Não se preocupe, Hannah, pois não mais mencionaremos tal nome. E aqui é razoavelmente seguro. Vários Papais Noéis colocaram proteções especiais por toda a Cidade do Natal e ninguém pode entrar aqui se não desejamos. As proteções aqui são quase tão poderosas quanto as Brumas que ocultam Avalon.
- Mandou-nos chamar, Papai Noel? – disse um dos duendes que entraram pela porta.
Um deles era gordinho e baixo, usando óculos com armação dourada e vasta costeleta. Um cavanhaque fino e pontudo moldava-se de maneira estranha no queixo redondo como o resto do rosto. Olhos marrons vivos, como duas avelãs, podiam ser vistos por trás das lentes, que se apoiavam na armação apoiada no nariz pontudo e fino. As roupas eram brancas em cima na camisa e verdes nas calças largas com suspensórios da mesma cor, com detalhes em dourado e vermelho. Um colete de veludo carmesim e um chapéu pontudo também vermelho terminavam as roupas. Calçava botas longas.
Outro usava uma camisa amarela e calças marrons. Um gorro vermelho lhe descia por trás da cabeça. O rosto era imberbe e sério, e comparado com os rostos sorridentes que Hannah havia visto até aquele momento era um pouco assustador. Uma pequena espada pendia-lhe à cintura e um arco às costas. Pareciam de brinquedo, mas havia algo que aparentava ser muito real naquilo. Botas altas, quase na altura do joelho e um colete de cor marrom escura lhe terminavam a forma.
O último na verdade parecia muito mais “humano” que os demais. Parecia um garoto da mesma idade de Hannah, com olhos e cabelos escuros, vestido em jaqueta verde escura e camisa verde de tom mais claro, com calças na mesma cor, assim como sapatos e um toucado, todos no verde escuro. Um cachecol vermelho e branco era a única cor diferente nele. Pareceria um garoto, se não fosse as orelhas pontudas e levemente alongadas.
- Esses são meus melhores auxiliares e amigos na Cidade de Natal. – disse Sven – Gaspar, nosso sábio e estudioso, Chefe dos Pesquisadores; – disse Sven, apontando o duende gordinho, que fez uma mesura cumprimentando os convidados – Melchior, o melhor lutador que temos aqui, Chefe dos Guardiões da Cidade do Natal; – apontou agora o duende de rosto sério – e Benhardt, que é responsável pela Cidade quando não estou aqui. – disse, apontando o duende que parecia uma criança comum.
- Por que fomos chamados, Pai Natal? – disse Gaspar.
- Por causa disso… – disse Sven, mostrando o Filigrana.
- O que? – disse Melchior – Foi um deles que…
- Não foi nenhum deles que invocou isso, Melchior. Eles também foram atacados.
- Então não fomos os únicos? – disse Benhardt – Imaginei que não seríamos.
- Vocês também foram atacados? – questionou Ingrid.
- Talvez seja melhor vocês mesmos verem. – disse Sven – Benhardt, pode providenciar transporte?
A viagem no carrinho de trem pela Cidade de Natal tinha algo de mágico: era como estar em um cruzamento de presépio, vilarejo alemão e casa de boneca.
Todas as casas tinham proporções de brinquedo e eram amplas e bonitas e coloridas. Como Ingrid dissera, Hannah pode ver que por todos os lados haviam cores, sempre vibrantes: vermelho, amarelo, verde, em alguns lugares o azul e o branco, além de tons de laranja e rosa em alguns locais. Visgo, azevinho, carvalho, os símbolos do Natal: tudo isso podia ser visto.
As pessoas, tanto duendes quanto alguns seres humanos que habitavam o local, podiam ser vistos trabalhando em comunidade e ordem, embora risos, conversas animadas e música podiam ser percebidas por todos os lugares.
Foi quando eles começaram a parar perto do que aparentava ser a saída de um túnel. Parecia escuro e frio e dava muito medo:
- Chegamos! – disse Benhardt. – Foi aqui que fomos atacados.
Olhando de perto, Hannah via melhor: na verdade esse local deveria ser igual ao resto da Cidade do Natal, mas estava queimada e destruída: podia-se ver que as pedras tinham sido derretidas por uma quantidade imensa de calor.
- Pelos Cristais! Que lantajhar aconteceu aqui? – disse Radaj. Ingrid correu para um canto e tocou as pedras, sussurando algo com os olhos fechados.
Hannah correu aonde estava os restos de uma casa e pegou um pedaço de tecido queimado e o cheirou:
- Isso aqui é mais fedido que querosene queimado! – disse Hannah, jogado o pedaço de tecido ao chão e torcendo seu narizinho de botão, enojada.
- Alguma criatura queimou tudo aqui… – disse Ingrid – Mas… Ela não parece ter forma… Parecia uma bola de fogo, como um fogo-fátuo, mas mesmo olhando agora pela psicometria… Posso ver que ela tinha algo nela, como um Mal além do Mal, algo sinistro, além do Diabólico, além do que qualquer coisa que uma pessoa pode pensar…
Ingrid abriu os olhos assustada. Olhou ao vazio e desabou a chorar, orando e clamando por suas divindades:
- Deusa! Deusa! Proteja a nós, suas servas! Proteja a nós, ó Ceridwen!
Hannah correu para abraçar Ingrid. Hannah sabia que Ingrid estava sofrendo:
- Ingrid! Acabou… Está tudo bem… – disse Hannah, abraçando-a forte, enquanto a mesma chorava copiosamente.
- O Mal que eu vi… – disse Ingrid, entre lágrimas – Era um Mal além do Mal, além de qualquer coisa que podemos pensar. Um Mal que não se preocupa com submissão, mas apenas com destruição…
- É verdade. – disse Gaspar – Pesquisei nos tomos que temos aqui e não encontramos nada sobre essa criatura de fogo que destruiu essa vila.
- Perdi bons homens aqui. – disse Melchior – Eles morreram bravamente, mas não havia nada que pudéssemos fazer. Precisamos usar muita água e terra para destruir aqueles monstros… Apesar que não sei se os destruímos.
- Duvido. – disse Benhardt – Se tudo o que foi dito é verdade, essa criatura é algo muito maligno e poderoso. De antes da Aurora dos Tempos… Não é, Pai Natal.
- Sim… – disse Sven – Minhas Memórias Antecessoras dizem isso…
- Memórias Antecessoras? – disse Ingrid, se recompondo lentamente.
- Desde que Assinei a Santa Cláusula e concluí a Sucessão, tenho acesso às memórias de meus antecessores… Alguns deles viram criaturas similares, mas nunca nada como isso… Sempre achamos que a Cidade do Natal era segura… Mas como eles entraram? – disse Sven.
- Esperem! – disse Hannah, observando um canto – Tem algo aqui…
Hannah estava mexendo nos destroços de uma casa que ainda estava inteira…
- Isso aqui é… – disse Hannah, mexendo nos vários sacos.
- Triagem de cartas. – disse Gaspar – Aqui damos uma ajuda ao Pai Natal para separar as cartas das crianças boas e ruins.
- Será que alguém quis se vingar por receber carvão? – disse Hannah.
- Duvido. – falou Melchior – Mas existe um detalhe… Se aqui foi o ponto de onde começou a invasão… Como esse local não está totalmente destruído?
- Espera… – disse Radaj, observando as paredes calcinadas da casa – Existe algo estranho na porta… Alguém deve ter saído normalmente… E então…
- O que? – disse Melchior
Radaj caminhou até os restos de outra casa, totalmente destruída…
- Alguém sabe o que era aqui?
- Uma central dos Pesquisadores! – disse Gaspar, assustado
- Então… – disse Sven.
- Ingrid, você consegue tentar aquele truque de ver o que aconteceu de novo aqui? – disse Hannah
- Não se esforce demais, Ingrid-kynjah! – disse Radaj, observando-a – Você está fraca demais…
- Não… Estou melhor agora… – disse Ingrid, olhando para Radaj com olhos firmes, ainda que úmidos de lágrimas – Se eu ver por pouco tempo não terá problemas….
Ingrid tocou o chão, fechou os olhos e murmurou…
- Alguém trouxe uma carta estranha…. O envelope era escuro… Era uma criança, mesmo para o padrão dos duendes… Ela mostrou para um outro… Ele o abriu e o Filigrana se ergueu e… – Ingrid abriu os olhos.
- Deusa! Grande Mãe! Quem em sã consciência faria isso? – disse Ingrid, revoltada.
- A culpa não foi da criança em questão… – disse Sven
- Não foi isso que quis dizer. Quem enviaria uma carta como essa? Que tipo de monstro é esse que mandaria uma carta com um Monstro de Fogo dentro dela?
- Alguém que odeia o ser humano… Ou ao menos que odeia outros seres humanos… Mas quantos ataques já aconteceram? E onde mais eles irão atacar? – questionou-se Melchior
- Bem, sabemos o que está acontecendo. – disse Sven – Acho que mais do que nunca vocês devem localizar Angelus. Benhardt, chame Eliazar e outros mecânicos. Recolham os destroços do avião de Hannah e o reconstruam. Melchior: coloque todos os Guardiões de prontidão. Gaspar, precisaremos de todos os Pesquisadores obtendo informações úteis para eles. Quando a vocês, Ingrid, Hannah e Radaj, é melhor que descansem…
- Lollipop foi modificado por mim! – disse Hannah – Posso ajudar nesse caso.
- Eu sei alguma coisa sobre esses monstros, e não posso ficar parada assistindo isso. – disse Ingrid.
- Pelos Cristais, fui treinado nos Metroplexos. Se uma criatura é hostil, posso enfrentá-las sem pestanejar. – disse Radaj.
- Sou grato pela ajuda. – disse Sven – Não a tempo a perder. Vamos então.
Alguns dias depois, Lollipop estava totalmente reformado, uma pintura amarela e branca no Hidroavião. Ele foi reabastecido de suprimentos e muitas roupas e comida.
Todos receberam presentes: Radaj duas belas espadas curtas de prata, Ingrid dois punhais trabalhados em jóias e prata anã e Hannah uma tiara e várias fitas.
Presentes simples, mas que simbolizavam a esperança dos habitantes da Cidade do Natal de que fossem resolver o problema dos monstros terríveis que destruíram uma vila dentro da cidade.
- Espero que saibam o caminho. – disse Sven.
- É fácil. – disse Hannah – É seguir a segunda estrela à direita e então direto, até amanhecer.
- Isso é para a Terra do Nunca! – disse Sven, rindo – Não para o Templo do Senhor, onde vive Angelus.
- Eu sei o caminho… – disse Ingrid – Na verdade, nunca existe um caminho fixo, mas sei o caminho adequado.
- Bem, nos despedimos aqui. – disse Sven – Espero que sejam bem sucedidos. Ainda quero ver um certo par de meias amarelas em uma chaminé de Sligo. - ele terminou, bonachão, fazendo Hannah corar.
- Esperamos que sim. – disse Radaj
Hannah ligou Lollipop.
- OK… Motor ativado. Podem abrir os portões. – disse ela pelo rádio.
Melchior e seu amigo, Balthasar fizeram um sinal de positivo da torre de vigilância. Os portões de uma saída por água da Cidade do Natal foram abertos.
- Beleza… Sem nevasca ou ventos de rajada. A decolagem não deve dar problemas. Vejamos como você ficou, Lollipop. – disse Hannah, usando os manches para aumentar a velocidade.
O hidroavião voi deslizando pela água, até sair para uma baía que dava no mar Ártico.
- OK, V1… Rotação… V2… – disse Hannah, decolando. – Lollipop está magnífico! Erguendo pranchas de aterrizagem na água.
- Então podemos seguir adiante? – perguntou Ingrid.
- Sim. Sente na poltrona do co-piloto e vá dizendo a direção a tomar-se…
31 May 2016
Por Fábio Emilio Costa
Olá!
A idéia de Aventuras Primordiais! é escrever uma pequena série de contos interligados entre si passando-se no ambiente pulp que desenvolvi parcialmente, Primordiais. A idéia é mostrar uma ventura pulp e cliffhanger que dê uma noção do que se esperar em Espírito do Século. De qualquer modo, farei o melhor para que saia o melhor possível.
Bem depois dessa introdução besta, vamos ao que interessa:
Cleveland, EUA, 05:00 hora local
– “In Nomine Patris et Filli et Spiritui Sancto” – disse o jovem alto em roupas de Frade, enquanto sacava suas enormes pistolas. O demônio emitia um chiado rouco e agudo, sua aparência alienígena pouco afetando a mente do mesmo, embora a visão do mesmo fosse capaz de despedaçar a sanidade de uma pessoa normal como uma pedra estilhaçaria uma taça de cristal.
– Vamos acabar com isso de uma vez! – disse a Irmã, ao lado dele, sua Irmã em todos os sentidos. De suas costas, ela fez saltar uma enorme espada com uma cruz ao estilo celta gravada na guarda. A lâmina possuia uma série de pictos em gaélico e letras em fraktur, o antigo alfabeto estilizado usado em Bíblias, brilhando levemente, sem se saber se por causa da luz fina do por do sol que atravessava as janelas do depósito ou se por causa de um encantamento próprio. – Esse demônio já torrou minha paciência, Tobby. Tá na hora de devolver ele para seu senhor.
– Certo. – disse o jovem alto – É o fim da linha para ele, Jen.
A longa caçada ao demônio de formas alienígenas foi cansativa em todos os sentidos. Como uma minhoca gigantesca, ele era estranhamente imaterial, partes de seu corpo aparecendo e desaparecendo. O chiado do demônio, parecendo um apito vindo dos mais fundos abismos do Inferno, era de uma sonoridade apavorante. O cheiro da criatura era algo abissalmente ignóbil, como se o próprio fedor do Rio Styx impregnasse tal criatura.
E ainda assim, diante dos irmãos Tobby e Jenny, da Ordem de Santa Magdala, a criatura não parecia exercer nenhum poder. Pois esse era o dom dos integrantes da Militia, os Exorcistas de 1ª Classe da Ordem: um treinamento e uma preparação que ultrapassava todos os limites e os tornavam pessoas acima do medo normal, capazes de suportar a franca hediondade do verdadeiro Mal, alienígna aos conceitos humanos. E eles eram da Militia.
O monstro chiou, avançando seu corpo hediondo contra os dois. Eles se deslocaram, afastando-se da bocarra grande e fedorenta que se abrira. Jen atacara o corpo do monstro, mas ele tornou-se imaterial em instantes:
– Que droga é essa, Tobby? – disse Jen, tentando golpear novamente.
– Segundo nossos informantes, Pólipos das Profundezas. Uma criatura do panteão cósmico. Associada aos Cthulhunianos. – disse Tobby, atirando com a munição normal oferecida aos exorcistas.
– Que saco! Mais uma vez um cultista maluco libera uma p%#$a de um monstro do c$#%&*o e é a gente quem tem que consertar a bagunça. Quando esse filhos de uma rapariga vão aprender a não mexer com o que tá quieto?
– Eu aconselharia você a maneirar o linguajar, Jen.
– Que se dane! Depois pago penitência! Mas agora tenho coisas mais importantes para me preocupar. – disse Jen, cravando fundo sua Espada contra o Pólipo, que começou a se debater, tornando a parte ferida imaterial e escapando.
– Isso não vai funcionar! – disse Jen – Vamos ter que fazer um golpe rápido como treinamos.
– Procedimento Libera Sanctii? Parece uma boa idéia. Não vejo outra forma de vencermos.
– OK, vamos nessa! – disse Jen, correndo em direção ao monstro – Vamos ter pouco tempo!
Jen correu, o vestido de freira esvoaçante e as calçolas protegendo seu pudor ao mesmo tempo que permitiam o movimento amplo das pernas. Jen cravou a espada em uma longa parte da criatura, o sangue negro e fedorento jorrando. A espada atravessou a criatura, enquanto cravou-se na parede de tijolos do depósito. Ela girou a lâmina para abrir o máximo de carne possível da criatura.
– Agora, Tobby! – gritou Jen – Acaba com essa coisa!
– “Glória Patri et Fílio et Spirítui Sancto. Sicut erat in princípio et nunc et semper et in saecula saeculórum. Amen” – entoou Tobby, armando sua pistola com a munição especial – Sacred!
Os disparos da munição anti-demônios fez o depósito se ilumar com o brilho das cruzes que apareceram nos locais onde os tiros acertaram. O Pólipo chiou ainda mais alto e fechou sua bocarra, desfazendo-se em uma poça de uma gosma marrom e fétida. Dois pequenos pedaços papel dentro do mesmo chamou a atenção de Jen, que rapidamente calçou uma luva e os pegou.
– Filigrana! – disse Jen – Uma invocação travada. Que legal! Algum espertinho anda vendendo amuletos para invocação de Antigos e depois a coisa todas explode.
– Bate com o que a Central da Ordem nos informou. Bem, não temos mais nada o que fazer aqui. Vamos voltar à Ordem. A turma da faxina já está a caminho.
Sligo, Irlanda, 10:00 hora local
– “Ó Deusa Mãe, cuja face volta-se para a luz do sol. Receba agora minha oferenda.” – disse Ingrid, dispondo das frutas e flores. Cortou a maçã em quatro e colocou-a sob a pira. Usou a lente feita em Avalon para acender a pira com os raios do sol. O brilho do fogo das oferendas brilhou sobre a água do cálice, ao qual ela sorveu.
– “Sagrada Mãe, sou grata por sua força, que me permite trilhar o caminho entre as Estradas da Vida e da Morte.”
Hannah observava Ingrid em seu ritual: desde que se conheceram no Templo de Tar-Amaron, ela vem sendo sua “mãe”. Seu pai o Sargento Will Stryker, foi abatido dos céus por ninguém menos que o Barão Von Richtoffen, o Barão Vermelho. Ao menos, Hannah sabe que o Barão Vermelho honrou seu pai como combatente, saudando o caído em seu avião.
A cerimônia de Ingrid estava encerrada. Ingrid continuava pouco à vontade para atuar em rituais com outros seguidores do Culto Antigo, ou Wicca como os dos Reinos Interiores chamavam. Sabia que muitos dos seguidores do Culto nesse Reino Interior a viam como conselheira, mas ainda assim ficava pouco a vontade, usando a privacidade da pequena casa em Sligo, Irlanda, como refúgio de um mundo que compreende mas pelo qual não é compreendida. Ainda sente alguma falta de Avallöne, a terra de Avalon, a Ilha Sagrada. Mas sabe de sua missão diante da Deusa Mãe.
– Ingrid, tô com fome! – disse Hannah.
A pequena sapeca pode não parecer, mas era mais sábia que o normal. Ingrid sabia disso, pois ambas eram da mesma estirpe de pessoas, ainda que separadas por anos e mundos. Eram Primordiais, herdeiras de dons desconhecidos até para elas, que alguns consideram ser a última barreira entre os humanos e a destruição e o Mal absolutos. Mas apesar disso, Ingrid sabia, Hannah ainda era uma criança. E como toda criança, manhosa.
– Já vou preparar alguma coisa. – disse Ingrid, com sua voz harmoniosa. – Mas primeiro…
Foi quando ela percebeu que tinha algo errado.
– Hannah! Esconda-se!
Um papel arremessado ao chão próximo a Hannah se revelou uma criatura apavorante, meio homem-meio peixe. O cheiro revoltante de peixe apodrecido foi a primeira impressão. A visão de ambas imaginou de imediato os Jyaakkkar, os terríveis escravos mutantes dos Atlantes, mas desde que os Primordiais venceram o Senhor da Guerra Atlante Grh’ankarr e devolveram o trono do Reino Sob os Mares ao verdadeiro senhor, L’Khurn, existe uma paz inquieta entre Primordiais e Atlantes. Além disso, a visão é mais revoltante ainda.
Hannah teve pouco tempo, sendo agarrada pelos pés e erguida como uma boneca de pano sob o monstro. Ingrid apelou à sua magia:
– “Mãe-Deusa, tu que és Mãe que Tudo Provê, assim como o Destino é tecido pelos Fios das Tecelãs do Tempo, teça ao solo o inimigo e o impeça de desfiar a trama do Destino que protege-nos” – disse Ingrid. Vinhas de grama se ergueram do chão e prenderam o monstro, o suficiente para que os chutes de Hannah surtissem efeito e permitissem a ela escapar.
Mas não mais que isso: a pele do monstro possuia alguma substância pegajosa e fedorenta que a impregnava e permitiu que ele soltasse-se da armadilha mística de Ingrid. Ele avançava na direção da mesma, que tinha apenas sua faca cerimonial em suas mãos. Ela a arremessou, mas o monstro se esquivou por pouco, e a substância pegajosa corroeu a lâmina da faca, que fumegou e dissolveu.
Foi quando uma lâmina levemente azulada trespassou o peito da criatura:
– Você está bem, Hannah-kynjah? – disse o homem que segurava a lâmina atrás do demônio, que gritava.
A substância não era metálica, mais parecendo com algum tipo de gelatina endurecida, mas era perceptível, pelos urros de agonia do demônio, que era uma lâmina muito afiada.
O homem, que tinha cabelos tão verdes quanto os olhos, virou a lâmina da espada para cima e, com um repuxão, trespassou o corpo, rachando o monstro em dois da altura do estômago monstruoso até a cabeça repulsiva meio-homem meio-peixe. A velocidade com que a lâmina saiu deu a impressão de que a lâmina foi impulsionada por uma pessoa dez vezes mais forte que o jovem em questão. Mas com extrema precisão ele a parou no ar no exato momento em que as vísceras nojentas do monstro desabavam próximo a Ingrid.
– Obrigada, Radaj. – disse Ingrid.
A pequena Hannah, ainda um pouco chorosa, perguntou:
– O que diabos é isso?
– Não é um xenomorfo, isso posso garantir. – disse Radaj – Embora seja de uma aparência tão hedionda quanto um.
– Acho que sei. – disse Ingrid – É um Demônio Submerso, uma criatura de Antes da Aurora do Homem!
– Como assim, Ingrid? – disse Hannah, enquanto percebiam que uma gosma nojenta começava a se formar enquanto o corpo do monstro derretia. Pedaços de papel podiam ser vistos, e Ingrid pegou-os com uma pinça.
– Filigrana. Tem alguma magia residual. – disse Ingrid. – Hannah, o Lollipop está preparado?
– Sim. – disse Hannah, ao ouvir o nome do hidroavião que era sua posse mais adorada – Só vou precisar por um macacão e dar uma última checada em tudo. Tem pressa?
– Não. Eu e Radaj precisamos preparar algumas coisas ainda. Tome o tempo que precisar para preparar tudo. – disse Ingrid.
– Onde vamos? – disse Hannah
– Ao Templo de Angelus. Acho que ele saberá nos dizer o que está acontecendo! – disse Ingrid, mencionando o Arcanjo do Senhor que ajuda os Primordiais.